Mas
afinal, o que é o Provão?
O
Provão, ou Exame Nacional de Cursos, é um
instrumento criado pelo MEC com a finalidade
de responder a uma necessidade do Ensino
Superior Brasileiro: a de avaliar os cursos
de graduação de todo o país, fornecendo
um retrato da qualidade do ensino oferecido
pelas instituições que se dedicam a tal,
sendo elas públicas ou privadas. O objetivo
último desta avaliação, segundo o
governo, é fazer um diagnóstico que
permita agir nos cursos, forçando uma
melhora do ensino e proteger assim a população
das más escolas e dos profissionais
formados nas mesmas. Trata-se de um exame
pontual, no final do curso, que se dispõe a
avaliar o conhecimento adquirido pelos
alunos ao longo do mesmo, sob pena de não
receberem seus diplomas caso não compareçam
aos locais de prova.
Para a emissão dos conceitos, de A
a E, é feita a média aritmética das notas
de todos os alunos que fizeram a prova em
cada Escola. Depois, estas médias são
dispostas em ordem crescente, formando-se um
ranking destas escolas. Após isso,
procede-se à emissão dos conceitos
seguindo uma distribuição dada por uma
Curva de Gauss pré-definida, da seguinte
forma:
-
12% maiores
notas : conceito A.
-
18% notas
seguintes: conceito B.
-
40% notas
seguintes: conceito C.
-
18% notas
seguintes: conceito D.
-
12% últimas
notas: conceito E.
A
distribuição é fixa, de forma que não
haveria como (se supostamente várias
escolas melhorassem sua média absoluta)
aumentar o número de escolas A e diminuir o
de escolas E.
Assim, a
nota A não quer dizer que a escola tirou
entre 80 e 100 na prova, como a maioria das
pessoas pensa. A nota é comparativa, de
forma que as 12% maiores notas do Brasil
sempre serão A. Se a maior nota no Provão
for 3, três será a nota A.
O que o
Provão faz, é simplesmente comparar as
escolas entre si, sem estabelecer padrões a
serem atingidos e mascarando uma realidade
que é clara: a de que todo o ensino
superior no Brasil precisa urgentemente de
reformas.
Utilizando-se
o Curso de Medicina como exemplo, podemos
analisar os resultados do Provão de 1999: a
maior média entre as Escolas Médicas foi
63,2, sendo que a média geral dos cursos de
Medicina foi 49,9, a maior dentre todos os
cursos analisados, porém menos que 50% do
valor da prova.
O Provão
apresenta um sério problema, pois é uma
avaliação punitiva e não construtiva. As
escolas que obtiverem os conceitos D e E por
três anos consecutivos podem ser fechadas,
entretanto não é oferecido a elas tempo
suficiente para que possam reparar os erros
e no caso das faculdades e universidades públicas
o governo não repassa o dinheiro necessário
para que se implemente melhorias nas
escolas. Com a avaliação recaindo sobre os
alunos, estes têm sido extremamente
pressionados, e a ameaça de
descredenciamento
das escolas com desempenho ruim faz
com que surjam os chamados cursinhos, forma
infame de preparar os alunos para a prova.
A situação chegou a
tal ponto que, para o exame deste ano, a
Uniban (Universidade Bandeirantes – SP)
dará um carro 0 Km (um corsa) para a comissão
de formatura da turma, caso tirem “A” no
Provão !!!
É fundamental que os
estudantes e docentes tenham uma visão mais
crítica quanto às repercussões que o Provão
pode provocar.
Analisando-se mais detidamente
essas questões, surgem outras colocações,
de cunho político. Apesar de as escolas públicas
terem obtido melhores conceitos nesses
primeiros exames (e provavelmente obterão
nos próximos), esse panorama pode mudar a médio
prazo, considerando-se que as escolas
privadas têm mais condições de realizar
mudanças (contratação de professores,
reforma de prédios, compra de equipamentos
de laboratório etc) e em tempo mais curto
que as instituições estaduais e
principalmente federais. Isso poderia levar
a uma progressiva melhora do desempenho das
instituições privadas e justificar, do
ponto de vista governamental, a privatização
do ensino superior brasileiro.
Paralelamente
a isso, o governo incentiva a abertura de
novas escolas. Ora, bem sabemos que são
poucas as instituições públicas que têm
“capacidade”(pela própria falta de
recursos) de criar novos cursos. Essa ampliação
se daria, então, através do ensino
privado, que tendo autonomia para criar
cursos e todas as facilidades garantidas,
pode aumentar o número de pessoas que
acessam os cursos superiores, sem lhes
garantir qualidade de ensino nem
possibilidade de inserção no mercado para
os profissionais. Criam-se verdadeiras fábricas
de diplomas. O Provão entraria para fechar
as escolas “ruins” e deixar no mercado
apenas os bons profissionais, quando a lógica
seria regular a abertura de escolas e
garantir a qualidade aos que buscam o ensino
superior !!!
Como meio
de protesto e de tentar acabar com a
acreditação dada ao resultado do Provão
(ou seja, a fé pública gerada em torno
desse exame), os Centros Acadêmicos de
Medicina de todo o país estão unidos em um
movimento de Interferência nos Resultados.
Esse trabalho consiste na conscientização
dos alunos e da população sobre todas
faces desse que, para muitos, é um método
fidedigno de avaliação. Os alunos de
algumas das grandes escolas de Medicina do
país, cujas tradições estão
indiscutivelmente acima de qualquer
resultado de avaliação, estão empenhados
em tirar conceitos ruins este ano, de modo
que se altere o ranking das faculdades,
aparecendo escolas que tiraram A ou B no
anos passado no final da lista, e,
automaticamente, escolas que tiraram D ou E,
apareçam no topo (lembre-se que 30% sempre
terá conceito A ou B, independentemente do
resultado real na prova).
Os
formando em Medicina da Universidade
Estadual de Maringá, que realizam o teste
este ano, não interferirão no resultado,
pois o Curso é relativamente novo (13 anos,
muito novo em comparação com os mais
tradicionais do país) e as repercussões de
uma nota baixa fugiriam do nosso objetivo,
graças à acreditação pública. Para
explicar melhor a questão da acreditação,
um exemplo comum será utilizado: o ISO
9.000, o qual, apesar de não ser vinculado
a órgãos governamentais, alcançou grande
credibilidade junto a empresas e
profissionais da área, assim como junto a
população: ter o ISO passou a ser sinônimo
de qualidade. Processo semelhante está
ocorrendo com o Provão: tirar A ou B é sinônimo
de qualidade, mas essa idéia não é
correta, por motivos já explicados.
Porém, o
fato de não ocorrer interferência na UEM não
quer dizer que os alunos concordem com o método
ou que não manifestem o seu
descontentamento. Os alunos farão a avaliação
munidos de adesivos de protesto, que serão
colados na camiseta e na prova.
Esse
texto, baseado em uma cartilha criada pela
DENEN (Direção Executiva Nacional dos
Estudantes de Medicina), e adaptada com
conceitos levantados no último EREM
(Encontro Regional dos Estudantes de
Medicina), realizado em Mogi das Cruzes, SP,
tem por objetivo esclarecer à população
em geral algumas dúvidas sobre o tão
falado Provão, bem como auxiliar os demais
alunos que serão submetidos a tal exame.
Murilo Ruiz
Presidente do CAMEM |