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Mais perto dos órgãos artificiais

Thomsom e seus colegas obtiveram, por doação consentida, 36 óvulos fecundados e ainda embriões humanos em estágios muito iniciais (fase de clivagem do ovo). Um caldo de cultura com os nutrientes indispensáveis manteve esses ovos humanos vivos, em tubos de ensaio, até atingirem o estágio de blastocisto (composto por uma vesícula simples com um pequeno broto de células).

Os pesquisadores retiraram a vesícula externa, e por meio de microcirurgia, sugaram grupos de células do interior, cultivando-as sobre uma camada de células embrionárias de rato. Estas funcionaram como "babás", alimentando e impedindo a morte das células humanas. As células humanas deram origem a uma colônia de células capazes de se dividir indefinidamente no tubo de ensaio, sem perder o caráter de célula primitiva indiferenciada. Tal colônia podia ser facilmente congelada e depois descongelada, voltando a crescer no tubo de ensaio.
As propriedades bioquímicas e biológicas de uma dessas linhagens celulares, batizada de H9, indicaram que se tratava de "células-tronco embrionárias" pluripotentes, capazes de originar todos os tecidos que compõem o ser humano, do cérebro até unhas e cabelos. Essas células nunca haviam sido obtidas da espécie humana.

Ao serem colocadas em cultura, tais células empilhavam-se e começavam a se diferenciar, dando origem a diferentes tipos de células encontradas no corpo humano. Injetadas em camundongos SCID (que não têm sistema imunológico e, por isso, aceitam sem rejeição células de outras espécies), as células H9 deram origem a um tumor (cisto). O tumor, uma massa esférica, continha praticamente todos os tipos de tecidos humanos, embora de forma desorganizada: osso, cartilagem, músculo, tubo digestivo, rim, tecido nervoso e outros.
Essas bolas de tecido humano, conhecidas na medicina como "teratomas", são encontradas eventualmente no abdome de algumas pessoas, talvez como resultado de um pequeno acidente embriológico durante sua gestação. A presença de teratomas humanos nos camundongos que receberam a célula H9 mostra que essas células primitivas podem dar origem a qualquer tipo de tecido ou de órgão humano, desde que estejam em um ambiente favorável, como o que o camundongo imunodeficiente fornece. Nenhuma anormalidade genética foi encontrada nessas células primitivas.

Que utilidade têm essas células que podem ser cultivadas e congeladas por tempo indefinido? Na pesquisa básica, elas ajudarão a estudar os fatores moleculares que regulam a diferenciação dos tecidos humanos. Para a biotecnologia, elas serão muito importantes para a produção em laboratório de diferentes órgãos puros, como o coração e o rim. As "cópias" de órgãos permitirão testar os efeitos de novos remédios diretamente sobre células humanas, e não mais em experiências com animais.

Para a medicina, essas células prestarão o inestimável serviço de gerar órgãos humanos novos e saudáveis, como pâncreas, tireóide e fígado, que poderão ser usados em transplantes. Uma dificuldade para isso será a rejeição dessas células estranhas pelo sistema imunológico do paciente, mas essa área da imunologia está avançando rapidamente, e soluções práticas são possíveis a médio prazo. Uma alternativa é a criação de um banco de células embrionárias primitivas, com as mais variadas composições genéticas. Assim seria possível escolher uma célula "parecida" imunologicamente com os tecidos do próprio paciente, minimizando a rejeição.
A disponibilidade inédita de células tronco embrionárias humanas poderá ainda ser utilizada para desenvolver novos e melhores métodos de terapia gênica, trocando tecidos defeituosos por tecidos saudáveis. Isso dependerá do desenvolvimento de métodos de induzir tolerância imunológica nos pacientes. A curto ou médio prazo, porém, não há possibilidade de que essas células sejam utilizadas para algum tipo de clonagem de seres humanos. Além do forte controle social e político sobre essas possíveis atividades, ainda não existe tecnicamente uma forma conhecida de permitir que tais células originem seres humanos organizados, se reinjetadas em mulheres.

É possível, quando muito, especular que algum país do Primeiro Mundo poderia no futuro descobrir como reconstruir com perfeição o blastocisto humano no laboratório. Nesse caso a clonagem de humanos sera possível a partir de células H9 (sempre femininas). Por suas profundas implicações éticas e religiosas, questões como essa estão sob intenso debate e sob rígido controle social na atualidade. É importante assegurar a participação crescente da sociedade na tomada de decisões quanto à política científica referente a essa área, sem cair no extremo oposto do obscurantismo radical. É preciso lembrar que as pesquisas com essas células são importantes para obter um banco de órgãos humanos no futuro, e isso significa a cura de numerosas doenças que hoje não têm solução.


George Alexandre dos Reis
Instituto de Biofísica, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
REVISTA CIÊNCIA HOJE, vol. 25/no 146.

 


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